sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

"Dificuldade de aprendizagem" - expressão maldita

Mais um artigo muito oportuno da psicóloga Rosely Sayão foi publicado em A Folha de São Paulo de 26/11/09 com o título "Dificuldades para aprender". Leia aqui no Observatório da Infância.

Não dá para ficar calado.


Dificuldades para aprender


Neste fim de ano letivo, muitos pais se preocupam com o rendimento passado do filho. Há os que ficam bravos com baixas notas, recuperação ou mesmo reprovação. Mas há os que ficam apreensivos porque ouvem dos professores que seu filho apresenta dificuldades de aprendizagem.

Deveríamos abolir essa expressão quando nos referimos à vida escolar das crianças -e temos motivos para tanto. O principal deles é que, por trás dessa frase, há uma multiplicidade de sentidos sem muita coerência entre si. Alunos com ritmos de aprendizagem diferentes dos de seus colegas, alunos dispersos, alunos com estilos específicos de aprendizagem, entre outros, costumam receber o diagnóstico de "dificuldade de aprendizagem" para justificar o baixo rendimento escolar.

Como entender essa expressão maldita? Vamos nos aventurar na missão possível de desconstruir essa frase tão usada.

O primeiro passo é aceitar a ideia de que todos temos dificuldades de aprendizagem. Por quê? Ora, porque aprender é trabalhoso e difícil e exige um reconhecimento fundamental: o de que não se sabe. Só pode começar a aprender quem admite que não sabe. E talvez um dos grandes problemas que crianças e jovens do mundo atual enfrentam seja esse.

Tem sido cada vez mais difícil para eles admitir que não sabem, que não conhecem, porque isso angustia e incomoda. E, em tempos de aparências, precisamos mostrar que sabemos muito, não é? Os mais novos logo percebem esse clima e o incorporam em suas vidas.

A questão é que lidar com a angústia de não saber não é fácil, então a melhor saída tem sido rejeitar tal estado. E isso gera dificuldade de aprendizagem, já que essa angústia é o que dispara o aprendizado. Quem tem filhos pode constatar esse fenômeno da recusa do desconhecimento ao observar quantas vezes as crianças repetem a frase "Eu sei, mãe" ou "Eu já conheço, pai".

O segundo passo para desconstruir a frase "dificuldades de aprendizagem" é o de reconhecermos também que o mundo nos leva a sermos hiperativos e dispersos. Ora, isso gera dificuldades para aprender, já que esta é uma atividade que exige concentração, esforço e dedicação -mesmo que temporária- a uma única coisa. Além disso, os obstáculos que surgem têm sido vistos como impedimentos, e não como desafios, por isso preferimos contorná-los a enfrentá-los. Isso, sim, é um problema para muitas crianças do mundo atual: parar, aquietar-se, lidar com a angústia de não saber, se concentrar, perseverar para, então, aprender.

Por isso e por muito mais, em vez de pensar nas "dificuldades de aprendizagem", seria mais produtivo lhes oferecer meios para que se desenvolvam e ponham em prática seu potencial.

Rosely Sayão

3 comentários:

Unknown disse...

Parabéns pela observaçao.
Sou Psicopedagoga e concordo que essa expressao ''Dificuldade de Aprendizagem''nao é a ideal e muitas vezes é usada por professores que nao conseguem descobrir, ou nem se esforçam para descobrir qual a melhor forma de atingir a assimilaçao do aluno.
Claro que existem problemas, porém, taxar uma crinça como sendo portadora de DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM, pode bloqueá-la ainda mais...fazendo o seu tempo, o seu momento, ainda mais longiquo.

Gosto muito desse blog. abraços
soraya

Anônimo disse...

Olá!
Parabéns pelo artigo. Esse ano passei por problemas emocionais sério com meu filho de 10 anos. A professora me fez comentários sobre essa "dificuldade" na frente dele e disse que não adiantava muita coisa porque ele não queria aprender. a partir desse momento meu filho ficou muito triste e sem motivação para os estudos. Percebi a angústia dele ao se esforçar e realmente não conseguir "entender".

Obrigada.

Claudilice

palita disse...

Olá, eu estou desesperada com o meu filho de 13 anos, já chumbou duas vezes, uma no 1ºciclo outra no 2º ciclo.É um rapaz inteligente mas não mostra o mínimo de interesse pela matéria escolar;acha que sabe tudo, não me dá hipóteses de o ajudar e os resultados no final dos períodos são lastimáveis.Perdeu o Pai num acidente aos cinco anos de idade e a psicóloga da escola acha que isso pode ter dado origem a algum tipo de bloqueio.Que posso eu fazer para ajudar o meu filho ?